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Entre seus fiéis colaboradores e amigos, estavam a atriz Tilda Swinton (estrela de sete de seus filmes) e o cineasta Isaac Julien, que acabam de realizar uma homenagem ao diretor através do documentário, Derek. O documentário reúne assim dois olhares distintos: a poesia e a sensibilidade da atriz que em texto off confidencia ao amigo morto suas inquietudes sobre os tempos atuais do cinema britânico, e por outro lado, o trabalho perspicaz e minucioso de pesquisa de arquivo de imagens sobre a vida de Jarman elaborada por Julien.
A base do filme é uma entrevista que o realizador deu em 1990 ao produtor Colin McCabe e o diretor Bernard Rose. Entre “linhas” se configura um homem sobretudo lúcido e sem remorsos. Ao ser perguntado por Jeremy Isaacs, no programa de televisão Face-to-Face, de como gostaria de ser lembrado, ele afirma que gostaria de desaparecer. Pegar todas as suas obras consigo e evaporar. Este desejo é algo que seus amigos e admiradores não deixaram acontecer, não somente seu jardim é conservado com zelo, como a sua obra é considerada como uma das mais importantes e provocadoras de sua época, algo sem igual nas artes britânicas atuais.
Em Derek, temos a oportunidade de conhecer o homem por detrás da obra – o que na verdade são bastante similares e complementares – através de um olhar íntimo e objetivo ao mesmo tempo. O documentário retraça os passos do diretor e sua forte relação com a religião e a homossexualidade, desde a infância, passando pelos tempos da descoberta sexual ao início de sua carreira, até a relação confidente que mantinha com a mãe, uma dona de casa, que tinha um grande senso intelectual e artístico. O espectador pode também acompanhar cronologicamente os últimos 40 anos de toda uma geração de artistas britânicos que influenciou e formatou uma estética punk e gay (queer) das artes contemporâneas na Inglaterra, culminando por marcar a era Tatcher.
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Suas obras são bastantes voltadas para a visualidade plástica e não é a toa que seu último filme, Blue, foi todo feito sobre uma tela azul. Ativista gay fervoroso, manifestou em prol dos direitos homossexuais tanto no seu trabalho como artista e cineasta, marcando tendências e promovendo movimentos artísticos tanto quanto transformou sua doença (Aids) em um ato de protesto e reivindicação para a comunidade gay britânica.
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Os tempos pós-Jarman são outros, como afirma Swinton em seu texto, o cinema de hoje determina sucesso em termos de bilheteria e audácia artística em termos de individualismo. A atriz sente saudades do amigo e de uma geração que acabou perdendo a sua própria “espiritualidade”. A cultura fílmica atual isola e paralisa vozes originais em nome de um cinema comercial de grandes orçamentos sem visão artística ou experimentalismos.
O documentário estreou no aniversário da morte do diretor em 19 de fevereiro deste ano na Inglaterra, passou pelo Festival do Cinema Queer de Vancouver e segue para o Mix Brasil em Novembro.
Leia aqui o texto que deu origem ao documentário, escrito por Tilda Swinton para o Festival de cinema de Edinburgh em 2002 e publicado pela revista Vertigo.
Hudson Moura
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