No conjunto estão os 22 filmes feitos por Glauber, além de 80 mil documentos, que incluem sua correspondência pessoal, roteiros de filmes, peças de teatro, poemas e romances.
Deste total, 223 roteiros e projetos de livro permanecem inéditos.
Segundo o ministro da Cultura, Juca Ferreira, a compra está praticamente fechada e deve ser anunciada até o final do mês. “A família tem plena noção da importância de Glauber para a cultura brasileira, e nós temos condições melhores para preservar este material’’, diz.
De acordo com Ferreira, a negociação faz parte de uma política maior de aquisição de acervos do cinema brasileiro por parte do ministério, que vai disponibilizá-los ao público na Cinemateca.
“Boa parte da memória do cinema nacional se perdeu, porque a preservação sempre foi precária. E, hoje, na Cinemateca, temos os melhores equipamentos do mundo para isto’’, diz.
A Cinemateca está restaurando o filme “O Leão de Sete Cabeças’’, feito por Glauber em 1970. Será relançado em cópias de 35 milímetros. Em julho deste ano, o ministério adquiriu o acervo da Companhia Atlântida Cinematográfica, com mais de 60 longas-metragens produzidos entre 1942
e 1974.
Papéis revelam roteiro inédito sobre Napoleão Bonaparte
O último projeto do cineasta Glauber Rocha (1939-1981) era fazer um filme inspirado na vida de Napoleão Bonaparte (1769-1821). Um mês antes de morrer, ele escreveu um roteiro em francês, até hoje inédito, com as principais ideias do longa. Também mencionou o tema em cartas a
amigos.
Há algumas semanas, o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, encontrou em sua biblioteca mais uma peça que ajuda a remontar esse projeto: a versão italiana do livro “O Império de Napoleão’’, de Stendhal (1783-1842), com anotações e rasuras feitas pelo cineasta.
A obra chegou às suas mãos em 1981, quando ele era presidente da Embrafilme. Glauber, que estava morando em Portugal, queria sensibilizá-lo a apoiar a produção. A estatal já havia patrocinado seu último filme, “Idade da Terra’’-cuja recepção pela crítica nacional e internacional foi terrível.
“Ele estava bastante deprimido por causa disto, mas falava de muitos planos’’, diz Amorim, que doou o livro à família de Glauber.
Os documentos não trazem uma ideia acabada e são, por vezes, contraditórios. Mas deixam claro que o longa teria muito pouco da biografia de Bonaparte e se prestaria a discutir temas comuns na obra
do cineasta, como liderança messiânica e revolução.
Nas margens do livro, ele anotou ideias gerais: “Os impérios materializam o inconsciente coletivo do povo através de seus patriarcas, que realizam as guerras purificadoras e fortificantes’’.
Também guardou, entre as páginas, um recorte de jornal falando de um leilão da Sotheby’s com armas do período napoleônico.
Já no roteiro, a história se passa nos anos 1980, num território “real e imaginário’’ chamado Trafalgar, na divisa entre Portugal e Espanha.
Reencarnação
O personagem central é Napoleão Viravante, proprietário de terras que se achava a reencarnação do general francês. Cercado por um exército de mercenários, ele pretendia conquistar a independência de seu país e dominar o mundo.
O texto é uma amostra típica do cinema conceitual de Glauber Rocha: “Na Caverna da Morte, protegidos por uma aranha gigante, estão guardados os títulos de propriedade de terra de Trafalgar’’. Irmã Vitória dos Ressuscitados, camponesa que fundou uma ordem religiosa, tem a missão de resgatá-los.
Em meio a intrigas políticas, Napoleão abandona sua mulher espanhola e decide se casar com uma amante africana. Napoleão é morto pela amante. O filme termina com um dançarino do balé Bolshoi assumindo o poder.
O roteiro, aparentemente nonsense, e com o qual o cineasta tentava levantar patrocínio na Europa, era apenas uma de suas ideias para este filme.
Antes de escrevê-lo, em carta a Celso Amorim, Glauber diz que já havia feito uma versão no Brasil, e pretendia fazer uma segunda.
“Este é o filme que vou fazer este ano, embora não saiba como [...] Se eu voltasse ao Brasyl, filmaria também “O Império de Napoleão’ com o título de “O Império de D. Pedro II’’’, escreveu. (Folhapress) Tweet
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